13/12/2010

Os Cus de Judas H, I - a anti-Última Ceia e a insônia


Leonardo Da Vinci, A Última Ceia (1498)
A Última Ceia aparece nas evangélias como a última refeição do Cristo antes da sua morte. A obra mais famosa que trata do tema é o afresco de Leonardo Da Vinci. (1498).
«Formávamos a cada jantar a anti-Última Ceia, o desejo comum de não morrer constituía, percebe?, a única fraternidade possível, eu não quero morrer, tu não queres morrer, ele não quer morrer, nós não queremos morrer, vós não quereis morrer, eles não querem morrer (...)» (página 62).
Este fragmento mais uma vez mostra a crueldade da guerra, a realidade em que a morte pode chegar num momento, quando menos a esperamos.

Porque a Anti-Última ceia? A Última Ceia foi um tipo de despedida do Cristo com os alunos, quando a morte foi algo já inevitável e domesticado. As refeições dos soldados foram diferentes, porque ninguém sabia se vai ver os seus amigos mais uma vez, e a morte, inevitável durante a guerra, não apontaria quem vai levar consigo, e por isso todos estavam inquietos. O Jesus foi calmo, porque foi ele que escolheu a morte, enquanto os soldados não queriam morrer, o que é muito bem visível em citação acima.

A guerra e as inquietações que causa levara o protagonista à insônia, que dura mesmo quando ele volta à casa em Portugal. «Há quanto tempo de facto não consigo dormir?» - pergunta ele (página 67). Sempre ele sente esta inquietação, por isso a guerra faz com que é impossível para o protagonista atingir a paz dos tempos anteriores à guerra (é mais uma justificação para eu colocar a não-chegada à paz no meu esquema da viagem do herói).

2 comentários:

  1. A "Última Ceia" é mais uma das evocações do narrador e portanto, como tens vindo a mostrar, ela integra uma estratégia formal que atravessa todo o romance. Mas nesta última ceia em Angola quem é Cristo e que são os apóstolos? Quem é que vai morrer aqui? Quem é o traidor? Parece-me que esta analogia tem um objectivo muito preciso, mas também limitações. Quais é que acham que são - objectivo e limites?

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  2. Foram duas pessoas que participaram na última ceia e que morreram, Jesús e Judas. O representante do bem e do mal,numa generalização, claro. Acho que a analogia a guerra colonial que ALA quis fazer é seguinte. Jesús representa os soldados que sacrificam a sua vida e o Judas são aqueles que ganham com a morte dos soldados, então os dirigentes em Portugal. Concordam com a minha interpretação?

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